O CAMINHO DA BUSCA

Tarde de uma Quarta-feira, estou prestes a cumprir um contrato para proferir uma palestra para um grupo de clínicas de hemodiálise, e fui conhecer um pouco mais de perto toda estrutura de uma delas.

Chego numa recepção simples, percebo pessoas simples, de todas as idades, rostos machucados pela dor e ainda carregando a esperança do transplante de rins.

Ali estavam pessoas que realmente lutavam pelo seu caminho de busca, uma busca talvez maior que a espiritual, a busca de permanecerem vivos.

Revistas folhadas por folhar e uma conversa de fazer apenas o tempo passar até sua vez chegar. A recepcionista chama um dos nomes. Esta pessoa se levanta para cumprir mais um ritual por sua existência, a de ficar conectada a um equipamento por um tempo que somente ela sabe quando dura.

Um solavanco na porta acusa a presença de mais um visitante daquele templo, sim , acredito que posso chamar de templo, pois ali as pessoas entram em busca de mais um sopro de vida e conseguem encontrar aquilo que buscam. A porta se abre e vejo um homem beirando seus 60 anos, conduzido pelo braço para dentro da sala. Ele era cego, sim cego e também mais um visitante daquele templo disfarçado por uma clínica de hemodiálise. Dizem que Deus tem o poder sobre a vida e a morte, mas ali eu vi a morte sendo vencida pela vontade das pessoas em continuar suas buscas até a salvação chegar, onde enfermeiras e médicos se confundem com anjos aliviadores de dor e anunciantes de uma esperança.

O homem entra, não há lugar para sentar-se, a sala de recepção está cheia, me levanto e lhe dou meu lugar, ele logo agradece e pergunta meu nome e seguido de seu agradecimento ouço a pronuncia de meu nome junto a outro agradecimento seu e uma bem humorada frase: “ser cego tem vantagens, nunca enxergamos se a sala esta vazia ou não, mas sei que sempre poderei encontrar um lugar no coração de alguém se levantando para eu sentar…

Em seguida logo foi pronunciando vários nomes e perguntando se estas pessoas estavam na sala, ele conhecia o nome de cada pessoa de seu horário de atendimento e mais ainda sabia tudo sobre aquelas pessoas, perguntava até sobre seu acompanhante e a cada um que era chamado para cumprir seu ritual de existência dentro da clínica ele mandava uma mensagem positiva: “firme amigo, você venceu mais uma vez, ainda vamos continuar com nossas pequenas vitórias nesta longa guerra da vida, com certeza alguém um dia vai inventar uma água-santa para cada um de nós…

Ele tinha todos os problemas daquelas pessoas ali naquela clínica, naquela sala de recepção, e ainda era cego, porém encontrava na sua escuridão uma luz para dividir e até iluminar o caminho de cada um que estava ao seu lado.

Jamais vou esquecer o momento em que seu nome foi chamado, ele levantou com tanta felicidade e disse: “Bem, a vida vai ter de agüentar por mais algum tempo e por todo tempo que eu decidir não desistir dela, aí vou eu destino, enfrentá-lo frente a frente e mais uma vez vou lhe pregar uma peça, estou meio sem rins e cego, mas ainda posso sentir o sopro de Deus na minha nuca…

Este homem é um verdadeiro buscador, ele é um verdadeiro instrumento da vida, enquanto muitos buscam em caminhos de peregrinação, caminhos de templos… ele encontrou-se dentro de si mesmo, reconheceu o Sopro de Deus em sua nuca e se reverenciou diante Dele.

É na sua nuca, sim, na sua nuca que o Sopro do Criador bate, não nos cantos do mundo, nas trilhas secretas, nos livros sagrados, nos rituais místicos… é na sua nuca que o Sopro de Deus bate.

Talvez você esteja com tanta pressa de correr pelos caminhos sagrados que nem percebe o sagrado soprando em sua nuca o tempo todo, corre Dele a cada passo que dá em qualquer direção.

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Cesar Romão
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