SEGUINDO UMA ORDEM AO PÉ DA LETRA

Ordem é ordem, mas será que sempre quem a dá tem noção dos efeitos colaterais dessa ordem?
Ordem é ordem, mas será que sempre quem a obedece está realmente cumprindo o objetivo dessa ordem?
Certa vez, ao tentar entrar pelo portão lateral de um clube onde faria uma palestra, meu carro não estava com o referido crachá para aquele portão. O motivo era simples: os organizadores do evento não o forneceram e pensei: Tudo bem, explico ao guarda e pronto! Mas, na verdade, se eu soubesse que explicar ao guarda seria tão difícil, teria pulado o muro do local do evento.
O cidadão aproximou-se do carro e logo com aquele ar de segurança, de que é dono do local, foi pedindo o crachá. Expliquei a ele quem eu era e o que iria fazer lá, inclusive mostrei a ele, bem na frente do portão, um outdoor anunciando o evento com uma foto minha e a resposta foi impressionante:
– O Sr. pode ser quem quiser, mas sem o crachá, ninguém passa por este portão! São ordens da diretoria do clube!
Expliquei a ele, novamente, e solicitei que ligasse para os organizadores que já estavam à minha espera. Foi o mesmo que falar como uma pedra. Outra resposta impressionante:
– Aqui eu não ligo para ninguém! Sigo as ordens! Não devo incomodar ninguém da diretoria. Sem o crachá, aqui ninguém passa!
O evento só começou no horário, porque um dos membros da organização chegou após 45 minutos de uma demonstração de autoridade que seguia ordens.
Dias atrás, telefono para meu amigo Cláudio Maksoud e o convido para assistir minha palestra no Hotel Maksoud. O evento teve início e, após alguns minutos, Cláudio Maksoud tentou entrar em sua sala de convenções explicando que era convidado para o evento. Uma senhora, cumprindo ordens, diz:
– Desculpe-me, mas somente com crachá se pode passar por esta porta!
Ele explica de quem é convidado e ela insiste na resposta. Ele diz que faz parte da diretoria do Hotel e ela responde:
– Sem crachá nem mesmo o dono vai passar por aqui, são ordens!
Ele sorri e diz:
– Bem, na verdade, sou Cláudio Maksoud!
Ela retribui o sorriso e insiste:
– O Sr. é a segunda pessoa que tenta entrar aqui hoje usando a mesma artimanha! E, vou lhe dizer mais, se insistir vou chamar a segurança! Sem crachá, ninguém entra no evento, são ordens!
Ao sair do evento procuro por Cláudio Maksoud e pergunto a razão dele não estar presente e é quando ele me conta toda história. Incrível… Então eu o convido para almoçar no Hotel junto com a comitiva do evento. Ele senta à mesa e logo outra pessoa louca para cumprir ordens dispara:
– Desculpe Sr., olhando para Cláudio, mas aqui nas mesas de almoço, somente pessoas com crachá! Poderia exibir o seu? Incrível…
E lá fomos nós, outra vez, tentar flexibilizar uma ordem que alguém fiel estava cumprindo.
Cláudio Maksoud é impedido de entrar e almoçar em seu próprio Hotel, tema com certeza para a versão II de seu livro “Perdido no Lobby”, uma autobiografia do Hotel Maksoud Plaza.
Dentro das organizações, atualmente, estou presenciando uma verdadeira enxurrada de ordens seguidas com o brilho do ego e poder de quem as emite e, pior ainda, estão acompanhadas de uma ameaçadora punição a quem não cumpri-las.
– Será que gerentes e lideres estão realmente preparados para emitir uma ordem, com tanta autoridade punitiva?
Ordens deveriam ser substituídas por Procedimentos. Sim, Procedimentos! Uma estratégia que permite a flexibilidade diante de possibilidades diferentes. Ações que permitam uma avaliação da situação e possam resultar em menos constrangimento às pessoas envolvidas no processo.
Recentemente, ao comprar uma passagem na TAM, apresento meu cartão fidelidade vermelho e quando tento pagar com cheque, a atendente diz:
– Desculpe Sr., mas não aceitamos cheques! São ordens da Companhia.
Com essa resposta não resisto e pergunto:
– Sua Companhia me fornece e me reconhece como um cliente fidelidade, cartão vermelho, e não aceita meu cheque? Que fidelização de cliente é esta? De que vale este cartãozinho vermelho, afinal sou um cliente diferenciado ou não? Veja em seu cadastro e você vai se surpreender com o número de viagens que faço por esta Companhia.
Depois de uma boa exposição sobre atendimento e fidelização de clientes alguém superior da atendente que cumpria ordens, disse que eu poderia pagar com cheque.
– Que ordens são essas?
A falta de preparo na emissão de ordens tem causado verdadeiros desastres neste mercado, onde o atendimento é a chave de futuras negociações. Quem dá ordens infla seu ego às custas de profissionais apavorados por perderem o emprego se não cumprirem essas ordens.
Procedimentos: este é o caminho. Este é o substitutivo da ordem. Ordenar vem de um tempo onde as pessoas não tinham conhecimentos para seguirem sozinhas por seus caminhos e não eram tão pensantes como nos dias de hoje, não possuíam um senso de avaliação tão aprimorado como nos dias de hoje.
Organizações que possuem subalternos, dirigidos por ordens, terão sempre a cara do emissor das ordens e estarão longe de criarem uma identidade aprimorada junto ao mercado.
Eu teria muitos outros casos para narrar sobre ordens! Mas, para não ficar muito longo o assunto, apenas mais uma. Num Hotel Fazenda eu entrego meu filho de 2 anos para um monitor e, depois de alguns minutos, vejo meu filho correndo sozinho. Indago ao monitor e ele responde:
– Bem Sr., recebemos ordens de nos responsabilizarmos apenas por crianças acima de 4 anos!
No cérebro do monitor não importava se algo acontecesse ao meu filho. Ele não teria responsabilidade alguma, uma vez que sua responsabilidade era apenas com crianças acima de 4 anos. Um Hotel que tem muito para aprender sobre Procedimentos.
Quando alguém lhe disser: “Estou cumprindo ordens” cuidado! Este alguém estará cumprindo ordens mesmo! E você já descobriu que as ordens sempre vêm acompanhadas de uma boa dose de síndrome de inferioridade egocêntrica de quem as emite e pelo temor de quem não as cumpre e, por isso, você vai sofrer as conseqüências.
As organizações precisam inverter os processos de ordens para processos de Procedimentos.
Quem segue ordem ao pé da letra, pode se arriscar a um pé no ouvido!

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