TROTE UNIVERSITÁRIO OU DECADÊNCIA UNIVERSITÁRIA?

Uma das cenas mais comuns, a cada início do ano letivo, nas ruas de muitas cidades, é a de jovens pintados de maneira humilhante fazendo um pedágio de mendigos nos faróis de movimentados cruzamentos, para entregarem o valor conseguido aos que se colocam como veteranos de uma instituição de ensino, pois, para os veteranos das faculdades e universidades, estes jovens que chegaram agora são apenas “bichos, calouros”, e não merecem outro tratamento senão a humilhação e a degradação pública.
Esta é uma das práticas conhecidas desses veteranos insanos. Algumas chegam a submeter os calouros a verdadeiras torturas, lesões corporais e outros procedimentos inconfessáveis.
Tornam-se cada vez mais corriqueiras notícias de que calouros são vítimas de lesões corporais nesses “trotes acadêmicos” e já se colecionam até casos em que jovens foram mortos durante esta prática desumana.
Alguém que entra na faculdade merece ser festejado, não humilhado. Este tipo inferior de tratamento aos novos acadêmicos não é “trote”: é uma vingança de outros jovens que não tiveram em suas vidas a educação, os princípios, os valores e o amor que compõem o caráter de uma pessoa para viver em sociedade.
Esses mesmos jovens que são humilhados hoje, por incrível que pareça, no próximo ano, em sua maioria, vão pagar na mesma moeda aos novos calouros, e assim forma-se um círculo de hipocrisia acadêmica.
Trote acadêmico deveria ser algo para promover a união desses jovens durante o período que vão estar juntos na instituição, despertando neles um espírito de liderança, civismo e visão social. Incentivando práticas nutritivas de comportamentos transformadores individual e coletivamente.
As instituições de ensino limitam-se a tentar controlar apenas o que acontece dentro de suas dependências estruturais, mas estão preparando jovens para atuar fora dessas dependências. Os mesmos jovens que causam humilhação, lesões corporais e até morte aos calouros, amanhã estarão operando em hospitais, atuando em tribunais ou ensinando na mesma instituição onde cometeram tais abusos. Com certeza não serão profissionais confiáveis dentro da sociedade, já que a raiz determina o caráter da planta.
Sempre me perguntam nas palestras que realizo em instituições de ensino qual seria minha primeira ação se fosse um deputado.
Com certeza meu primeiro projeto seria proibir qualquer tipo de “trote” que não tivesse o objetivo de enaltecer o caráter e a conduta humana, punindo severamente os praticantes desta vergonha acadêmica, promovendo a expulsão de alunos que incentivem ou pratiquem este procedimento.
O “trote” tem sido uma mancha negra na história de muitas instituições, mas como as mensalidades entram nos cofres destas instituições do mesmo jeito, o que acontece fora dos limites dos muros é problema dos alunos.
Enganam-se as instituições que não conseguem saber o que seus alunos fazem fora de seus muros. Além de falhar na educação, omitem-se no seu papel de criar profissionais éticos.
Este tipo de “trote” é um crime à inteligência humana, à integridade de cidadãos e ao sonho de muitos jovens que veem nas instituições de ensino o início de seu caminho profissional, até o momento em que são feridos em seu íntimo com esta prática. E o mais triste: o trote é um crime até hoje sem punição estabelecida.
O “trote” deveria ser compatível com as expectativas que um jovem tem ao ingressar numa universidade: a de que fará amigos, descobrirá novos horizontes, trará orgulho à sociedade e à sua família, fará de seu país um lugar melhor para se viver – sem ter de passar por humilhações, mas por enaltecimentos aos seus predicados de esperança para um futuro melhor.
Universidade que permite o “trote” decadente ainda não é uma universidade verdadeira, pois uma universidade verdadeira tem no aluno a imagem de um filho, e nenhum pai quer ver seu filho chegar em casa humilhado, por quem quer que seja, de maneira fútil, infame e degradante.

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